“Geography” reviewed by Jazz.pt

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Vítor Joaquim é um de variadíssimos casos na cena portuguesa de músicos para quem a improvisação é um processo fundamental, mas que nem por isso consideram tocar aquilo a que vamos chamando “música improvisada”. O facto de o seu instrumento ser o computador, e de este definir à partida o tipo de música que pratica (electrónica / electroacústica), contribui para assim se caracterizar, mas o curioso é verificarmos que o trajecto deste artista sonoro originário de Setúbal, mas há uns anos fixado no Porto, tem sido feito ao lado de figuras da livre-improvisação e mesmo do jazz criativo. Podemos, inclusive, ouvir alguns deles neste disco, como Joe Giardullo, Carlos “Zíngaro”, Gunter Heinz, Angélica V. Salvi, Gustavo Costa ou Ulrich Mitzlaff, com a sua inclusão através de “samples” explicada por Joaquim como uma forma de geolocalizar as suas memórias colaborativas pessoais – cada uma dessas parcerias aconteceu em determinados lugares, que não apenas em determinadas alturas do tempo.

Ora, acontece que este disco é sobre a determinação geográfica dos destinos da humanidade, tema particularmente pertinente nos dias de hoje, devido ao fenómeno dos refugiados do Médio Oriente e do Norte de África na Europa, à falsa “guerra civilizacional” entre o Ocidente e o Islão e ao extremar das situações de xenofobia, racismo e nacionalismo, com um regresso do obscurantismo nazi-fascista. Vítor Joaquim inspira-se mesmo num livro de Jared Diamond, “Guns, Germs and Steel – The Fates of Human Societies”, do qual utiliza como mote a seguinte passagem: «A história seguiu diferentes cursos para diferentes povos devido às diferenças nos ambientes desses povos e não por causa de distinções biológicas entre eles.» O que quer dizer que a mensagem é a mesma do jazz mais intervencionista e da música improvisada com consciência de si, ainda que os “drones” caleidoscópicos de “Geography” pareçam nada ter que ver com a sonoridade de ambas essas tendências. Assim desmentindo, de resto, que a electrónica seja apenas a banda sonora que se vai dando ao cosmos, na qualidade da mais escapista e alienada das músicas. Rui Eduardo Paes

via Jazz.pt